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IV Semana da Genealogia: balanço e resumo das apresentações
Por Henrique Trindade
Entre 17 e 21 de julho de 2023, o Museu da Imigração realizou a IV Semana da Genealogia. Um evento on-line dedicado à promoção e à difusão de conhecimento sobre o tema em diversas perspectivas e com novos olhares.
Pela primeira vez, algumas apresentações foram selecionadas a partir de um edital de chamamento para contribuições de pesquisadores, acadêmicos, genealogistas e interessados em geral para mostrar as suas pesquisas e narrar as vivências e as experiências práticas no campo da genealogia e da história da família. Os dois grandes temas e tópicos sugeridos foram os seguintes:
1. Fazer genealogia no século XXI: saberes e experiências
- Tecnologia e Genealogia
- Métodos e Técnicas de Pesquisa Genealógica
- Fontes de Pesquisa
- Preservação e Compartilhamento de Dados Genealógicos
- Histórias e Memórias Familiares
- Ética na Pesquisa Genealógica
2. Novos olhares e perspectivas de análise em genealogia
- Genealogia e Identidade
- Genealogia e Gênero
- Genealogia e Migração
- Genealogia e Saúde
- Genealogia e História Local
- Genealogia e Patrimônio
O resultado superou as expectativas em termos de adesão do público, perfis dos proponentes, formação e conteúdo das palestras. Cabe ressaltar ainda que a Semana contou com participações de convidados e parceiros do MI, que ajudaram a enriquecer as abordagens e promover reflexões importantes para o presente e o futuro da genealogia no Brasil.
Segue um resumo do conteúdo das apresentações:
17 de julho
1. "Ser" ou "Tornar-se" Italiana: vivências de uma genealogista e antropóloga ítalo-brasileira (Priscila Silva dos Santos)
A palestra discutiu a pesquisa de mestrado da autora sobre a construção da identidade italiana entre os descendentes de imigrantes em Pedra Dourada, Minas Gerais. A pesquisadora compartilhou a sua própria jornada de redescoberta da italianidade, aprendendo o idioma e utilizando os seus documentos italianos cotidianamente após imigrar para a França. O conteúdo explorou ainda como as vivências pessoais e coletivas moldam a nossa identidade e destacou a importância do turismo de raízes para os descendentes de imigrantes, promovendo a troca de memórias entre a Itália do século XIX e a Itália contemporânea.
2. Histórias e Memórias Familiares: uma cabo-verdiana no Brasil (Lucialina Maria Soares dos Reis)
Lucialina descreveu a sua experiência como imigrante cabo-verdiana no Brasil, país onde enfrentou dificuldades ao se adaptar a cultura brasileira em geral. Ao longo dos anos, ela se dedicou ao trabalho social e ao resgate das suas origens por meio da pesquisa genealógica e de relatos orais da sua família. Essa busca resultou em descobertas sobre as suas raízes africanas, europeias e indianas e foi complementada por informações do FamilySearch. As experiências e o engajamento social enriqueceram a sua conexão com as suas origens cabo-verdianas, refletindo na sua atuação como multiplicadora cultural entre os descendentes em sua comunidade no Brasil.
3. Tudo o que você sempre quis saber sobre o FamilySearch e nunca teve para quem perguntar (Marcelo Gayger Amaro)
Sendo Gerente de Operações de Suporte e Registros do FamilySearch, coordenando o Suporte do FS, o processamento de registros genealógicos para publicação e indexação e dos mais de 450 centros do FamilySearch no Brasil, Marcelo revelou algumas das principais e mais inovadoras funções do maior site genealógico do mundo. A palestra se concentrou especialmente numa sessão de perguntas e respostas com o público, com o intuito de esclarecer dúvidas gerais e mais específicas sobre metodologia de pesquisa no site, novos projetos, legislação e suporte em registros digitais.
18 de julho:
1. O método "faça você mesmo" de resgate histórico (Fabio Luis Ogasawara Akamine)
No final de 2022, o autor publicou o livro Agijabiyo! - Do Punk Rock ao Minyo - resgatando histórias da família. Nele, compartilha o processo de iniciar um projeto de pesquisa e registro das histórias da família Akamine, imigrantes de Okinawa para o Brasil em 1917. Com o avanço tecnológico, o autor utilizou ferramentas acessíveis para coletar, preservar e reconectar a família, espalhada pelo mundo, mantendo as raízes okinawanas em comum. A apresentação abordou as ferramentas e os métodos utilizados no projeto, incluindo plataformas de genealogia on-line, aplicativos de digitalização e restauração de documentos, além de técnicas para a localização de informações e pessoas. O autor também destacou as suas estratégias para coletar relatos orais e refletiu sobre a diferença entre o trabalho acadêmico e o "faça você mesmo".
2. Como o uso das ferramentas plano e diário de Pesquisa ajuda no processo de pesquisa genealógica (Regina Célia Boschi Vighetto)
Regina dissertou sobre o processo de pesquisa em genealogia e história da família e os passos que ajudam a manter o foco e conduzir uma pesquisa eficiente. Alguns deles são definir um problema ou objetivo específico para orientar a pesquisa, em seguida, a importância de coletar e analisar informações conhecidas, depois, desenvolver um plano de pesquisa com perguntas detalhadas e fontes a serem consultadas, incluindo registros on-line e repositórios. Além disso, apresentou a ferramenta do Diário de Pesquisa, um elemento fundamental para registrar o progresso, incluindo resultados, estratégias e fontes pesquisadas, evitando a duplicação de esforços e permitindo que outros pesquisadores sigam os mesmos passos. Essa metodologia, segundo a palestrante, facilita o trabalho e a colaboração, garantindo conclusões sólidas no estudo das origens familiares.
3. Gestão visual em genealogia: uso de kanban para planejamento de pesquisa (Rafael Saad Fernandez)
A palestra apresentou o conceito de Kanban, uma ferramenta de gestão visual, e propôs a sua aplicação na pesquisa genealógica. Por meio do uso do aplicativo Trello ou de quadros físicos, o pesquisador pode estruturar o seu trabalho em colunas como "Pendentes", "Em andamento", "Aguardando" e "Concluídas", atribuindo perguntas específicas de pesquisa a cada "cartão". O método ajudaria a organizar o processo de pesquisa, definindo as tarefas a serem realizadas, gerenciando os prazos e mantendo o genealogista focado e organizado, economizando tempo e evitando que ele se perca nos ramos investigados.
4. A genealogia na França e na Itália em 2023: comparações genealógicas e papéis das redes sociais (Charlotte Lekhal)
A palestra da genealogista francesa teve como objetivo apresentar o funcionamento das pesquisas genealógicas na França em comparação com as da Itália. A profissional também teve como propósito de demonstrar, por meio da sua experiência pessoal e profissional, a importância e os desafios das redes sociais para promover a genealogia.
19 de julho
1. Folhas soltas de um passado não tão solto assim (Elimar Cosme do Espírito Santo)
A pesquisa histórica e genealógica enfrenta o debate clássico sobre o que é considerado fonte para estudo. A noção de fonte histórica se ampliou desde meados do século XX, incluindo documentos "oficiais" e também arquivos privados, cartas, diários e vestígios arqueológicos. Porém, as folhas soltas, frequentemente negligenciadas e aterrorizantes para arquivistas, podem ser preciosidades para pesquisadores genealógicos. Essas folhas avulsas, encontradas em caixas de "folhas soltas", contêm dados genealógicos importantes e pistas valiosas para direcionar as pesquisas. A fala de Elimar se concentrou no manejo dessas informações, aparentemente inúteis, que podem ser verdadeiros tesouros para destravar árvores genealógicas.
2. Pesquisas e Passaportes (Henrique Trindade)
O intuito dessa apresentação foi revelar quais as principais fontes de pesquisa, arquivos e métodos para encontrar passaportes de imigrantes no Brasil. Foram exploradas as possibilidades de buscas no Acervo Digital do Museu da Imigração, na coleção museológica da instituição e o caminho para encontrar esse tipo de documentação em arquivos portugueses e no Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro, a partir do Registro Nacional de Estrangeiro.
3. Cartas de chamada familiares: Reflexões sobre cultura escrita de imigrantes portugueses no Brasil (Ana Carolina da Silveira Leite)
A partir das perspectivas teórico-metodológicas da História Social da Cultura Escrita, a palestra procurou analisar e discutir 14 cartas de chamada, com assinaturas coletivas, escritas por imigrantes portugueses, homens e/ou mulheres, entre 1896 e 1929. Para tanto, enfatizou a importância do diálogo entre áreas distintas e complementares das ciências humanas por meio do cruzamento de perspectivas: a mobilização de micro-histórias, a Linguística, a História Cultural e a Paleografia, retirando, assim, sujeitos históricos do esquecimento, dando voz a seus escritos e possibilitando, então, outros modos de se compreender a história da penetração da língua portuguesa no Brasil, destacando aspectos que podem revisar ou confirmar questões consolidadas pelas grandes narrativas sobre os processos de imigração familiar portuguesa ao Brasil. Afinal, o que se sabe sobre o Brasil e a escrita de imigrantes nesse período? Como eram essas cartas? Quem as escrevia e por quê? Para quem as escrevia? Quem assinava também escrevia? As respostas a essas questões foram debatidas, bem como os caminhos para chegar até elas, com o objetivo de contribuir para a construção de uma História Social da Cultura Escrita no Brasil através da epistolografia.
4. Acervos Pessoais: como salvaguardar o que temos em casa? (Otávio Balaguer e Eloisa Galvão)
A palestra foi conduzida pelo gestor da equipe de preservação do Museu da Imigração, Otávio Balaguer, e pela conservadora da instituição, Eloísa Galvão. Nela, os dois profissionais abordaram aspectos da produção de acervos pessoais, geralmente compostos de documentos textuais, iconográficos e objetos biográficos. O desafio da salvaguarda de tais acervos foi esclarecido por meio de ensinamentos práticos para a execução de ações de preservação em casa, como dicas de higienização, acondicionamento e armazenamento.
20 de julho
1. Pesquisa para cidadania portuguesa (Viviane Pompeu)
Reconstruir as trajetórias dos imigrantes que desembarcaram no Brasil séculos atrás tornou-se a chave para acessar os direitos inerentes à nacionalidade portuguesa. A viagem pelo tempo é desafiadora, uma vez que a maioria dos portugueses chegava ao território brasileiro sem certidões de nascimento e poucos tinham passaporte. Com a pesquisa genealógica, que estuda a origem, evolução e disseminação das várias gerações de uma família, os descendentes de portugueses conseguem recuperar documentos históricos necessários para o processo de dupla cidadania. Diante disso, a apresentação teve como objetivo abordar a maneira correta para a montagem da árvore genealógica e elencar fontes de pesquisa para a localização dos documentos exigidos para a nacionalidade portuguesa, sem deixar de mencionar a importância do resgate da história familiar e cultural como complemento à dupla cidadania.
2. Genealogia: do regaste das origens à contestação do status quo (Guilherme Felipe Silva de Castro)
Guilherme abordou um estudo da história de Carambeí, no Paraná, em que se evidencia a importância da análise genealógica para compreender a colonização da região. Além das fontes tradicionais, como livros de memória de memorialistas locais, os cemitérios desempenham um papel crucial ao fornecerem informações sobre as famílias e suas trajetórias ao longo do tempo. A confrontação de dados coletados em plataformas on-line e documentos oficiais permite montar um quebra-cabeças genealógico, proporcionando uma visão mais completa da formação do território e das relações de poder que influenciam a sociedade até hoje. Assim, para o palestrante, a genealogia, além de resgatar origens, se revela um método valioso para contestar padrões sociais e compreender privilégios arraigados na história local.
3. Ancestralidade na literatura infantil e infanto-juvenil (Julia Harumi Haji, Raquel Freitas, Renata Ap. Antunes da Silva)
As três educadoras do Museu da Imigração apresentaram títulos infantis e infanto-juvenis que permitem a construção de um rico diálogo sobre ancestralidade, tradição, laços familiares e identidade com crianças e adolescentes. As três obras selecionadas para a palestra fazem parte do espaço de leitura "Semear Leitores" do MI. As profissionais tiveram a oportunidade de compartilhar as suas experiências de educação com o público infantil e pontuar a necessidade de observarmos outras perspectivas de análise quando se aborda ancestralidade e história da família.
4. Genealogia e Imigração Croata (Renato de Lucca)
O genealogista profissional abordou temas como as fontes de informação no Brasil e na Croácia, a imigração croata/iugoslava no Brasil, os nomes e os sobrenomes comuns, os diferentes grupos étnicos, as cidades e as regiões da diáspora, os documentos familiares comuns e os desafios do idioma e da pesquisa.
21 de julho
1. A genealogia como ferramenta micro-histórica para desvendar as redes de relacionamento na Colônia Alemã Dom Pedro II, em Juiz de Fora (Rita de Cássia Lara Couto)
Na segunda metade do século XIX, foram estabelecidas duas colônias de imigrantes em Minas Gerais: Filadélfia (atual Teófilo Otoni) e a Colônia Alemã Dom Pedro II em Juiz de Fora. A chegada de 1.193 imigrantes alemães e tiroleses trouxe expectativas de desenvolvimento econômico e social à região. Apesar do interesse histórico, a história da Colônia Dom Pedro II ainda apresenta lacunas. A pesquisa micro-histórica e genealógica visa responder perguntas sobre os laços familiares e afetivos dos colonos, o impacto dessas relações em suas decisões migratórias e na vida da comunidade. Ao seguir indivíduos e famílias por meio de documentos diversos, a pesquisadora buscou reconstituir a trajetória da colônia alemã em Juiz de Fora, destacando as interações entre imigrantes e moradores locais e o encontro de duas culturas distintas.
2. Genealogia: a ciência "nômade" - um estudo de caso (Marcello Bhering Menezes)
O historiador destacou a importância do conhecimento científico em várias áreas para realizar pesquisas genealógicas de forma mais eficiente e profissional. A genealogia requer a integração de diversas ciências, como História, Sociologia, Geografia, entre outras, dependendo do objeto e objetivo do pesquisador. O autor compartilhou a sua experiência focada na imigração italiana em São Paulo e apresentou um caso específico da família "Trocini", resolvido com o uso de conhecimentos prévios de diferentes áreas. Ressaltou-se a necessidade de compreender fontes primárias e secundárias, paleografia, bases de dados digitais, entre outros aspectos, enfatizando a importância do conhecimento científico para a valorização e a profissionalização das pesquisas genealógicas.
3. Autoetnografia de reencontros: desvendando uma diáspora cearense por meio de fatos históricos, em uma interpretação sociopolítica (Amadeu Correia Batista Neto)
A pesquisa de autoetnografia do autor, iniciada em 2021, busca compreender a formação do núcleo familiar em Fortaleza. O processo começa com o luto pela perda do seu avô paterno e a sua orientadora de pesquisa. Para lidar com a dor, ele dá destaque às narrativas das memórias sensíveis da sua família, que veio de vilarejos interioranos e se estabeleceu na capital em diferentes períodos. O estudo utiliza a autoetnografia como metodologia antropológica para contextualizar os acontecimentos e os fatos históricos que influenciaram essas famílias, buscando entender como eles moldaram as suas memórias em um novo lugar. A pesquisa revelou descobertas sobre a ancestralidade do autor, incluindo possíveis laços com o líder abolicionista Dragão do Mar.
4. Painel de Ancestralidade e Saúde - O que e como são identificadas? (Ricardo Di Lazzaro Filho)
A última palestra apresentou a plataforma Genera, que identifica as porcentagens de ancestralidade e predisposições genéticas e também o sistema Busca Parentes e Relatos. O palestrante Ricardo di Lazzaro Filho é cofundador do laboratório Genera e também investe em várias empresas de tecnologia, saúde/biotecnologia e educação.